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quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Da Rio+20 ao mundo+100



Valério Igor Victorino
Sociólogo e Especialista em Desenvolvimento Urbano


Neste ano de 2012 o mundo comemora 40 anos de preocupação com o meio ambiente. A conferência de Estocolmo inaugurou polemicamente o debate sobre a governança internacional do meio ambiente, quando países como o Brasil e a Índia questionaram as premissas ambientais que orientaram os debates de cúpula frente às necessidades do desenvolvimento de suas economias. Em 1982 houve uma segunda conferência ambiental global em Nairóbi, no Quênia, a qual foi desprezada pelas grandes potências, que estavam mais preocupadas com os dramáticos lances da Guerra fria.
A conferência do Rio de janeiro de 1992 teve o mérito de promover a declaração dos princípios fundamentais da sustentabilidade e, de modo geral, todo o processo que culminou com a conferência conseguiu estabelecer um marco muito importante na governança ambiental internacional por conseguir posicionar a questão da sustentabilidade nas agendas políticas locais, nacionais e internacionais. Desta conferência surgiram os tratados sobre mudança climática, biodiversidade e desertificação. É por volta deste período que a questão ambiental começa de fato a se institucionalizar pelo mundo afora, fazendo parte de constituições nacionais e de estruturas administrativas locais, regionais e nacionais. Neste período começa a ser difundida a idéia de desenvolvimento sustentável, que mesmo sem que haja unanimidade a cerca de seu significado tem ampla aceitação em discursos públicos e privados “politicamente corretos”.
A despeito das melhorias em muitas áreas do desenvolvimento e do meio ambiente, o mundo não fez progressos significativos em direção à sustentabilidade aspirada na conferência do Rio 1992 e nos encontros ambientais internacionais subseqüentes. Nos últimos 20 anos a economia cresceu fortemente, mas os Objetivos do Milênio ainda estão longe de se realizarem para a maioria da população planetária. Junto com o crescimento do consumo global persistem as disparidades sociais e as desigualdades de gênero, os biomas e a riqueza da biodiversidade continuam em processo de deterioração e as crises econômicas, de energia, de alimentos são recorrentes.
A conferência RIO+20, que se realizará no final de junho de 2012, é apresentada como uma oportunidade mundial para reafirmar a sustentabilidade socioambiental como prioridade principal das organizações governamentais, econômicas e da sociedade civil e para reafirmar a validade contínua dos princípios da Declaração do Rio 92 e da Agenda 21. Dois serão os grandes temas desta conferência global: “A economia verde no contexto do desenvolvimento sustentável e da erradicação da pobreza e o quadro Institucional para o desenvolvimento sustentável.”
Contudo, o que é “economia verde”? O que é “desenvolvimento sustentável”? Estas expressões, não obstante sua popularidade em alguns meios, ainda são muito abstratas e por que não dizer vagas, de pouca consistência conceitual. Entre os principais desafios de um modelo econômico de produção e consumo sustentável estaria principalmente o de internalizar as externalidades dos custos ambientais garantindo a equidade social. Neste sentido a valoração dos recursos naturais e dos serviços ambientais emerge na forma de taxas e incentivos fiscais a práticas sustentáveis. Por outro lado, para reduzir a pobreza e promover a equidade social seria necessário determinar os objetivos socioambientais da economia verde. Para erradicar a pobreza a “economia verde” deverá gerar empregos, gerar renda e aumentar o consumo. Contudo, ficam as questões: qual tipo de emprego? Como aumentar o consumo das camadas de baixa renda dentro de um padrão sustentável de produção e consumo? A “economia verde” deverá significar um modelo de desenvolvimento econômico onde a responsabilidade da pessoa jurídica vá muito além da geração de lucro aos acionistas e incorpore expressamente em suas metas a redução da pobreza, a promoção da equidade social e preservação da riqueza dos biomas do planeta.
 Na coordenação desta “economia verde” o Estado deve garantir os direitos humanos básicos e promover a participação cidadã no planejamento e implementação de políticas públicas que conectem as dimensões sociais, ambientais e econômicas. Também deverá o Estado expandir a adoção critérios ambientais em suas contratações e licitações em todos os níveis administrativos, considerando-se que é o grande consumidor, por excelência. O fomento deste novo paradigma de produção e consumo poderá ser beneficiado pela priorização dos setores da economia que deverão tomar a dianteira do processo de mudança. Neste sentido as áreas de construção civil, energia, agricultura, transporte e turismo despontam como exemplos onde o engajamento inovador deve necessariamente se processar para promover os anseios desta nova economia.
A equidade social e a sustentabilidade devem estar no centro das políticas publicas e das decisões privadas, induzindo um novo padrão de progresso e prosperidade que vá além da medida tradicional do PIB. Para tanto basta recordar os princípios da Conferência anterior: Principio 4: Integrar as dimensões econômicas, sociais e ambientais na tomada de decisões e assegurar que os objetivos sociais e ambientais norteiem os enfoques econômicos;  Princípio 10: estabelecer e aprimorar os mecanismos de governança socioambiental participativa. Principio 21: investir no treinamento e emprego da juventude de modo a construir as habilidades básicas para tornar a economia verde e para assegurar a participação no processo de desenvolvimento e na divisão equitativa dos frutos do desenvolvimento.
É no nível local que devem ocorrer as manifestações concretas sobre a sustentabilidade que necessitamos. Neste sentido a Organização das Nações Unidas deve dinamizar os mecanismos de intercâmbio científico e tecnológico visando a troca de experiências de gestão estratégica dos territórios com vistas à construção de cidades sustentáveis – onde a articulação e a integração das políticas setoriais de mobilidade, habitação, energia, saneamento urbano e proteção da biodiversidade sejam uma realidade.
Enfim, a educação ou a reeducação de todas as gerações para a criação de um novo pacto social voltado para a sustentação da diversidade biológica e cultural do planeta, de acordo com princípios éticos da convivência pacífica e harmoniosa, é imperativa e urgente. A conferência Rio+20 é o evento ambiental mais importante da década e não podemos permitir que seus resultados sejam pífios ou inexpressivos; sob pena de estarmos desperdiçando uma imensa oportunidade de transformarmos os padrões culturais que tornam insustentável o nosso modo de existir e comprometem o futuro da vida no planeta.


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