Páginas

segunda-feira, 30 de maio de 2011

Criar Futuros - Rose Marie Inojosa

CRIAR FUTUROS
Rose Marie Inojosa

Lembremo-nos de que somos Terra.
Cada um de nós é uma parte dessa comunidade de vida ímpar do Planeta Terra. Compartilhando e combinando elementos do cosmos, das estrelas, deu-se nesse pequeno planeta uma alquimia a que chamamos vida. Uma teia de singularidades interdependentes que foi se constituindo há milhões de anos. Nós todos existimos desde então nesse processo contínuo de co-criação da vida e, se hoje somos uma espécie singular, continuamos intrisecamente ligados e codependentes de todas as demais espécies que são neste momento histórico as flores da vida. Em algum momento poderemos ser humos para novas flores da evolução.

A percepção de que Somos Terra é a base para compreender essa peculiar capacidade humana de criação de cultura, que se dá no diálogo entre a singularidade da espécie e o complexo da vida. A cultura resulta da nossa capacidade de co-criação e de transitar no tempo entre as gerações e projetarmo-nos no futuro. Mas isso se dá, ainda, na teia de vida de que participamos, com as manifestações de ciência e arte realizando-se nas diferentes relações que estabelecemos entre nós e com outros seres, com os elementos que nos constituem fora e dentro de cada um.

Esse é o grande cenário da nossa saga, da saga da espécie humana que vem se constituindo há breves milhões de anos, resultante de outros bilhões de anos de evolução na dinâmica da vida.

As nossas pequenas histórias coletivas e pessoais nascem da intimidade com cada lugar onde brotamos. Carregamos no peito a relação específica com um bioma, com uma paisagem, com os seus habitantes. O homem da floresta carrega dentro de si a mata, seus cheiros, visões, possibilidades. O homem ribeirinho carrega o som do rio, os peixes, as invenções de sobrevivência às suas margens, para comer, abrigar-se, criar. Quando despregados de seus lugares, levam-nos consigo e deles se alimentam.

Mas há um fenômeno novo na história da humanidade – a maioria da população agora vive em cidades. E as cidades se constituíram na negação e não no diálogo com matas, os rios, a convivência com outras espécies.

Então, o que levamos no peito nós filhos das cidades? Caixinhas? Canos e torneiras? Geladeiras? Automóveis? Descartáveis?

Essas utilidades, esses confortos que criamos fizeram-nos esquecer de onde vêm e para onde vão. Extraímos tudo da mesma matriz e devolvemos tudo a ela. Já não de maneira respeitosa, equilibrada, mas com sanha de consumo e desprezo pelas consequências.

Como esses elementos culturais contemporâneos e típicos das cidades, no contexto de um modelo econômico intrinsecamente desigual e socialmente injusto, estão impactando nossa evolução como espécie e co-evolução na comunidade da vida?

Por que essa produção cultural tem resultado na vulnerabilização da espécie humana a ponto de ameaçar a sua sobrevivência? Como a crescente consciência dos riscos têm despertado e provocado a nossa capacidade de resiliência?

Os artistas sempre percebem antes e têm gerado processos de crítica e religação.

A ciência também entrou em campo para reduzir danos e pensar novos modelos e tecnologias.

Estamos nesse ponto. E aqui conversando sobre esse cenário, essas possibilidades, esse futuro.

Somos co-criadores de futuros.

O futuro que estamos criando agora tem cheiro de mato, tem asas, patas e raízes? Ou é a visão de uma espécie solitária agonizando?

Ao lado de um intenso trabalho de despoluição do ar, da água, de recuperação da cobertura vegetal, de desenvolvimento de tecnologias para mobilidade, construções, produção e circulação mais sustentável de mercadorias, etc., está brotando na educação e nas artes um processo de abertura de consciência para a vida.

Inicialmente calcada apenas na explicação racional dos problemas e nas estratégias e formas de redução de danos e de novas tecnologias para um conforto verde, essa movimentação da educação passou a dialogar também com a arte, buscando alcançar as pessoas pelo re-encantamento do mundo, pela redescoberta da íntima ligação com a teia da vida.

Como substituir, em nosso peito, a caixinha descartável que traz meio quilo de jabuticabas pelo convívio com a generosa árvore que, além de muitos quilos de jabuticaba, traz para a nossa vida perfume, beleza, pássaros, capacidade de multiplicação?

Nessa megametrópole que é São Paulo a sociedade se move, se manifesta, produz arte e inquietação. A academia e as empresas envolvem-se na busca intensa de alternativas tecnológicas para solucionar problemas da insustentabilidade. O poder público se empenha em recuperar a cobertura vegetal ampliando o número de parques e plantando milhares de árvores; em recuperar os rios e córregos, em capturar o metano gerado pelo lixo, etc. E há, também, laboratórios de re-encantamento do mundo.

Um desses laboratórios é a UMAPAZ – Universidade Aberta do Meio Ambiente e Cultura de Paz , onde são oferecidos programas de reflexão crítica e, também, oportunidades de trazer para nosso peito vivências com a natureza, de tomar lições com as árvores, de experimentar formas de convívio sustentável por meio de diálogo, danças, música, de mergulhar na lógica de sustentação da vida de todos e para todos.

Nesse momento, uma exposição expressa profundamente essa busca de re-encantamento, ela se chama SOMOS TERRA e todos estão convidados para sua abertura dia 3 de junho de 2011, às 17 horas .

¹Este texto foi escrito para a participação da SVMA/UMAPAZ no Encontro CULTURE/FUTURES: Transição para uma Era Ecológica, dia 30 de maio de 2011.
²Diretora da UMAPAZ (rosemarieinojosa@bol.com.br)
³A UMAPAZ é um departamento da Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente de São Paulo: www.prefeitura.sp.gov.br/umapaz; http://www.blogumapaz.blogspot.com/
4 Av. IV Centenário, 1268, Portão 7-A do Parque Ibirapuera, São Paulo, SP, Brasil

Nenhum comentário:

Postar um comentário